sábado, 28 de maio de 2016

Os sinos da igreja a badalarem 11:30 a se moverem , devagar e Novembro nos vidros , o café em frente a loja de gangas, o café com o mundo dentro, todos os dias ali paro . Todos os dias vejo a senhora triste, com a cruz de prata na mão enquanto sopra o chá e o sopro leva para a Dona Ofélia um sorriso escondido de uma senhora, idosa, pele enrodilhada, embrulhada na tristeza e na resignação, olhos com mãos que puxam os sorrisos enquanto o chá emana pequenas orações que sibilam dos lábios da senhora que trata daquela a quem tanto procura












- Vai ver que tudo se trata tudo se vai pôr bem









O medo de morrer, o medo de ir. A tosse que não me deixava, o susto do cigarro, o susto que eu sentia quando a dor me subia e me fechava a traqueia, e eu, assustado,devorado pelos estores no escuro, os lençõis que me vestiam como se eu fosse as cortinas metidas, sem dormir,a senhora do terço, a senhora da cruz









- cancro









E só o medo de pensar me causava desespero. Via-me enterrado , ali, já viste, mãe, eu no caixão ?! meu deus! E o coveiro, o sacana, a vir a minha mesa , isto é verdade, mãe, a vir a minha mesa









- já recebes-te?









Os meus olhos saltavam! Saíam como pedras lançadas de uma fisga









- hâ?









A Graça da cozinha a exclamar









- essa tosse









Eu na cama









- vou morrer









Fora dela e depois dela a falar com todos e a pensar









- quantos destes virão ao meu funeral?









O meu patrão a passar por mim , sempre calmo, descontraído e sério









- virá ele ao meu funeral?









E o caixão bem arranjado, será que iriam chorar por mim? uma pequena multidão, de luto, a minha roda , olhando feito abutres









- Pobre rapaz…também teve cá uma sina









E nisto, o patrão ao fundo , o coveiro a largar a mesa do café onde eu estava e eu a ver nele a pá a deitar terra e mais terra e a pedra da fisga a ir com mais velocidade e mais velocidade comigo na cama a pedir perdão e saber que posso morrer sofrendo com as agressões do cigarro e a pedra a ir com mais força, e a cruz de prata a balançar de um lado ao outro, os lençõis, cortinas onde os estores me apertam









- cancro









Não Não a perder a fala , a ter dificuldades para respirar, a ter dificuldades para emitir qualquer espécie de som, deixava de viver, deixava de namorar, apavorava-me isso! a pedra a embater na árvore e abrir um buraco , uma esfera, pequena, escura, os meus olhos feitos rato a espreitarem lá para dentro, a lembrar-me nesse momento quando perdi o dente da frente, deitado na cama a chorar em desespero que as raparigas nunca mais me vão olhar, nunca mais vão olhar para mim e apertava com mais força o choro no quarto da minha mãe e o Jorge , o cliente que atendo na companhia em silêncio ele









- ainda falas ?









E eu a pensar mas afinal









- ainda falas









A mexer os papeis no balcão e









- ainda falas









E pedra que me levava ver-me como o meu avõ sofreu até a última, morreu com o cigarro na boca, o cigarro queimou-lhe os pulmões, dilacerou-os por completo ,abriu crateras, sofreu…e eu ver-me assim ! todos no meu funeral, até o coveiro, e eu, onde?









- já recebeu?









E a Graça da cozinha sem graça nenhuma a dizer-me









- O coveiro veio-te buscar









- hÂ?









E a pedra já não estava comigo na cama já me acompanhava até ao café da vila nisto olhava para as pessoas a pensar Vou morrer olhavam para mim em silêncio









- Vai morrer









E a tosse cuspir-me a dignidade na cama que não é minha , nos lençõis que não são meus, nos estores que não são meus, na almofada que não é minha, a cuspir-me até ser jogado para a frente do médico enquanto a cruz de prata balançava na mão da









- Cancro









o jornal ao lado da secretária do consultório com a língua de fora dobrada Em paz e eu sentado depois de ter sido observado com as mãos fechadas uma sob a outra o médico









- Isso passa









e enquanto as orações sibilavam do chá, os sinos anunciavam as 12 badaladas e a da pele enrugada num silêncio que tremelicava nas bochechas como se bebericassem pequenos nervos semelhantes as gotículas das lágrimas que a gente deita quando reclama através do choro aquilo que nunca se teve e que se encontra agora a nadar no vazio dos seus olhos negros onde uma mão lhe passa pelos cabelos brancos ainda tratados e o rosto que se desvia , carinhosamente os olhos se deitam, se aninham no olhar da sua amiga que sorri sem ali estar presente nela









- Vai ver que tudo se trata tudo se vai pôr bem









Aí os sustos! eu no limoeiro apanhar as cascas para a infusão, eu no sobreiro com um saco aberto , a meio da noite, os outros escondidos, eu a girar , a girar nas mantas, nos lençõis, a girar , a girar o saco aberto para apanhar a criatura e desejar não quero morrer









- Cambuzinos ao saco !









e a voz dentro de mim que me apertava em silêncio , a voz que me assustava dentro de mim e ao mesmo tempo sai disparada de detrás do sobreiro e me joga fora como uma mola direito ao chão! saio a correr... a chorar , pelas pedras partidas da telha no chão, a passar as bananeiras em prantos , a limpar as lágrimas na minha corrida , apavorado, com o sobreiro atrás a dizer









- Então









e num segundo tinha-o deixado para trás juntamente com a horta do meu tio juntamente com a noite e juntamente com os meus amigos que agora me surgiam quando me julgava sozinho e me rodeavam e me abraçavam já sob a luz do candeeiro









- isso passa









O médico









- Vá, fique bem









Novembro nos vidros , o café em frente a loja de gangas, o café com o mundo dentro, a senhora do terço









- afinal não era nada









O coveiro a largar uma mesa onde um rapaz de olhos arrepiados o olhava









- o diploma, do curso!









A senhora do terço num espelho a dizer-me









- não passa de um sonho uma ilusão perfeita









os pombos sozinhos na praça, uma revista perdida, um assobio do vento, um pedaço de frio nas pálpebras e









- não passa de um sonho uma ilusão perfeita









Os sinos da Igreja a chegarem as doze badaladas e eu acordar









- Será que sonhei?

sexta-feira, 29 de março de 2013

Como Arrumar a casa

Como arrumar a casa

A cómoda em madeira desgastada guarda todos os meus ursinhos, o Pico, Fuuffu,o Bolinha, sorriem para mim e são os meus amigos nas camisolas que a mãe arrumou;
- Santo anjo do Senhor, santo anjo da guarda,vele por mim de dia e de noite
 foi bordado com pequenas linhas azuis e  enfeita o quarto que o Pai António fez, a prima Rosa,deu de presente o candeeiro com a cor do seu nome, o anjo da guarda,também tem uma cor no quadro,a mãe , trouxe os amigos da almofada que respiram comigo o doce das cortinas brancas, suaves como quando estou nos braços do pai António
- braçinhos quentinhos e fofinhos
 Arruma as coisas com uma prontidão imediata, coloca na cesta os ovos da tia Rosa,na sala, o sofá é limpo em todos os pormenores, um canto com um papel da loja do Senhor Janeca:
- Celebremos na Páscoa o Perdão
O pai diz que o perdão faz crescer as pessoas e que uma casa arrumada são as Ideias colocadas em ordem.Tudo o que eu me lembro é que era um bébé sempre muito sereno e muito sorridente,nunca me pareceu outra coisa que senão  isso,eles andavam felizes, a dispensa pelo que me recordo:
- existo na ordem de uma medida correta
começa com os frascos de um arroz em Inglês Rice, os temperos da cozinha Oriental todos alinhados como um platão
-As grandes naturezas produzem grandes vícios, assim como grandes virtudes.
E a grande virtude tornada pequena num frasco de especiarias, os taparués, empilhados mas numa simetria reveladora de sua Mestria, Fazendo as pequenas coisas bem, faremos acontecer as grandes coisas, dizia o avô enquanto construía o primeiro andar da casa e o padre a abençoar o pirralho enquanto os óculos detinham as passagens
- a fé, deve ser revelada nas obras
 O pai diz que eu devo crescer,que se eu crescer , também poderei mostrar ao Senhor Jesus o meu amor por ele,gosto imenso deste cheiro dos livros arrumados na biblioteca da casa,quando for grande como o meu Pai António,vou colecionar canetas carissimas,colocar os meus peluches no escritorio e ao lado dos livros de Matémática a fazerem companhia aos da Literatura poética. Vou estudar,colecionar ferramentas ,chaves de fendas,martelos e esquadros,vou resolver os problemas quando a sanita avariar,trocar as pilhas ao comando da campainha,quando a minha Mulher quiser vou às compras no jipe e levo o farrusco,aquele narizinho pretinho e molhadinho é tão fofinho,fofinho fofinho foifnho!!!
Diz a mãe  afagando-o em miminhos enqunto brinca com as suas ferramentas de plástico,coloca-o no berço,lê uma passagem do Evangelho e o pirralho adormece,desce as escadas e acaba de limpar a coleção de chávenas de café,passa pelas moedas de ouro que estão na sala ao lado de convivio,todos os prémios ganhos em desporto,
- sempre gostou muito de competir
coloca a ultima taça ganha ao lado do Melhor Pai do Mundo, 
- Bom marido, Lucrécia
e a Lucrécia a interregar o Bom pastor
- o que pedis de mim bom Pai?
A arrumação perfeita,a sala dos troféus é cuidada todos os dias,a sala,disposta com as cortinas a cantarem salmos de louvor e gratidão,a estande e os diplomas  cumprimentam a lareira, lume do qual ganhou pastor, louvando versos nas douradas pontas flamejantes
-O Senhor é o meu pastor, nada me faltará
E os anjos a serem retirados do móvel para o chá, a loiça fina com os fios laranja do irmão sol no rebordo a aquecerem os lábios da Tia rosa e do avô Francisco, alguns bolinhos dispostos pela mesa com o pão e a linguiça,o avô Francisco a escrever um versosito e a entregar um medalhão ao menino que dorme,o senhor Padre diz que Devemos crescer e não minguar,Uma casa arrumada, ideias no lugar, a procissão vai até à cozinha e os tachos apertados entre si
- que altura danada esta para sermos tachos de aluminio
os alhos e as cebolas na porta debaixo,a máquina do café aquecer e a procissão
- Vinde Senhor Jesus
e jesus Nosso Senhor na sala  a conversar com os diplomas e com o fogo, enquanto a loiça a sair da máquina e os bolos a serem preparados,as toalhas arrumadas por ordem: as da sala numa gaveta,as da cozinha noutra, os napperons com Francisco e Jacinta
- vimos agora para aqui fazer não sei bem o quê
a vela acesa proclama a fé do napperon e o chá quente da sala a entreter-se nas entranhas,a tia ao fundo, corta uma fatia de pão repara que tudo ocupa uma ordem perfeita na mesa,o salmo na ponta da chama
- Onde há amor existe a ordem
Diz o Bom pastor à Senhora Lucrécia que vai contente para casa depois de ter saído da fonte por onde os milagres se fazem e as pedras se tornam castelos
- onde há amor existe a ordem
come um pouco de pão e bebe um pouco de leite eleito:  a melhor Vaca do Ano! Pelo que sei era uma Senhora dedicada,religiosa,boa profissional,o bébé,está a ainda a crescer, um dia,um dia... há-te mostrar as obras que tiver a mostrar,por enquanto, Jesus, pede que arrumemos a sala,coloquemos cada coisa no lugar
- Não vá o Diabo Têce-las e cairmos do Cavalo
diz o Padre da Casa, arrumemos as flores nos vasos e lhes dê de beber, as mantas dobre-as
- se não as dobrar-mos poderemos atrair coisas más
coloque a roupa suja para lavar que Deus não aprecia os maus cheiros,arranje os estores que está para arranjar,arrume o quarto,as camisas no camiseiro,as calças na gaveta, gravatas: sejam sãs, tire-as do plástico;guarde as roupas de verão, use as de inverno,seja limpo, não pelo muito que limpa mas pelo pouco que suja,arrume a garagem,não aconteça quando o Senhor chegar,  encontrar peúgas e boxeres por aí e o fogo a querer se chatear!





terça-feira, 26 de março de 2013

Como Fazer a Barba



Lembro-me quando tinha 10 anos. O primeiro pêlo. Passava horas durante a tarde a olhar para o espelho do ciclomotor do meu pai Afonso. 
Numa noite, uns larápios lá vindos de Grândola,roubaram a motorizada de 4 velocidades  de cor doirada ao meu pai, o meu irmão tinha saído de madrugada, a televisão ligada,os grilos  num canto de um móvel com uma fotografia familiar,enchi-me de pena quando soube da noticia da minha mãe ter fugido com outro,nunca vi o meu pai chorar. Acordava  durante as noites e dava com ele na sala, Fumava um cigarro com a ponta direccionada para mim enquanto as frases encorpadas de uma personalidade exterior a ele :

- roubaram-ma

E reclamava ,exigia ao tempo ,a Deus, aos anjos e a quem mais haja por aí,   lá que me dessem o que é meu,pêlos…assim já podia ajudar o meu pai e eu podia ser Homem e tentar perceber as coisas que ocorriam, já suportava andar pela aldeia tendo perdido aquela motorizada, já podia de peito inchado e erguido ,porque a barba me concluía, já podia, saber o que  era a vida no sentido das palavras da Sra. Silvina lá da aldeia:

- quando tiveres barba na cara filho…

Corria para a casa de banho. Trancava-me a sete chaves. Pegava na Gillette, na espuma de Barbear,molhava o rosto pueril e moreno,os olhos verdes enfiados no espelho,o fio de um castanho cor de fogo,um sorriso inocente e ansioso pelos anos vindouros; ao lado, um creme hidratante para amaciar e amolecer os pêlos ( ausentes ainda)para facilitarem o deslizamento da lãmina,olhava para os hidrantes do meu pai

- Vou ser Homem

Consultava um livro, sabia que a melhor hora para a desfazer ( e como me imaginava com uma barba perfeita) seria à noite, a oleosidade da pele que é já  em maior quantidade ajudar-me-ia ,ouvia os amigos mais velhos a dizerem entre si nos treinos de futebol:

- primeiro molhas o rosto com a água quente para abrir os poros

A minha ãnsia aumentava! E fazia ,mesmo não tendo pêlos, tudo na forma correta: a lâmina  no sentido do crescimento do pêlo, os cremes tudo da Natura

- os melhores

 E passava os meus dias em busca do tal pêlo grosso mas nada . Passava uma e duas e três e quatro,de seguida, pegava no bálsamo e colocava em abundância. Ardia e não acreditava quando me lembrava:

-roubaram-ma..!

A minha mãe pegava em mim de manhã e saíamos pelas traseiras da casa.Eu não julgava a minha mãe

( mas não entendia porque razão tinha que ir ter com o amigo à beira da estrada )

o que eu sei é que aquilo era desconhecido para o meu pai que não tinha barba na cara,apenas um ligeiro capim branco. Anos mais tarde dei com ele a olhar para o espelho e numa voz curva a reivindicar ,reclamava,exigia ao tempo ,a Deus, aos anjos e a quem mais de direito  lá de cima que lhe dessem o que era pertença sua,( eu pensava para mim que devia ser falta de barba na cara) se eu ao menos… nessa altura os pêlos tivessem aparecido quando eu suplicava

- só um pêlito…

Podia ter ajudado um pouco mais , a motorizada roubada foi encontrada no mato,Deixa o resto, junto aos policias ele dizia:

- era minha

Enquanto a personalidade exterior dele pegava em mim e me vestia com a dor ali a bramir 

- ela era minha…

A dor rendia-me,braços ao ar!!? Perguntava: o que devia fazer? A casa estava perdida.  A casa era pequenina Sr.Doutor,janelas  pirralhas de onde à noite sons me deixavam constrangido e os sons me diziam:

- que vergonha isto

E que vergonha um Homem não ter barba na cara, que vergonha nem um pêlito para uma pessoa erguer o peito em importância, dinheiro nunca houve, não me lembro, recordo mais o que me faltava do que aquilo que tive,as janelas que não eram grandes , pequeninas e cheias de cor diferentes das da sala,o cão piegas sem uma coleira decente,o meu pai constantemente entrava no quarto a perguntar:

- a vossa mãe?

Eu não dizia nada.  Calava e morria naquele crime. Imaginem o que é uma criança passar por isso, os sons apareciam assim que ele fechava a porta e não eram só as janelas que eram pirralhas e barulhentas também, o móvel da casa do meu tio em Lisboa na Quinta da Taínha, quando a minha tia o via de bigode molhado pelo vinho a cantar o fado no meio da sala, elas, idênticamente desinquietas a proferirem como se tivessem um cinto  nas partes:

- que vergonha isto

O pai ainda não ganhou barba na cara e todos os dias olha para o espelho num constante monólogo:

- Ela era minha

 o filho, ganhou uns tostões no loto2,cresceu, adquiriu barba comprida, de desfazer ,todos os dias , de manhã à noite,  o tio, foi visto a correr ao lado dos comboios na linha do Cais de Sodré na tentativa de ser pássaro e da motorizada sabemos que não ficou resto algum para contar história.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Aprender a imitar a água

Um dia, quando as pedras deixarem de ser pedras, quando os barulhos da água deixarem de soar no pássaro poisado sob o galho cuja verga é a folha do meu rosto , um dia , quando os homens forem um só instante e num só segundo eu me tornar rio, para desaguar na existência da liberdade e desaguar na sede do teu amor, sem ritos e proclamações , eu serei um breve momento de um voo de pássaro , na ponta do bico, as minhas letras, as minhas vidas , as minhas vozes, os meus papéis e o silêncio exterior . Minto. Minto quando digo que amo o silêncio, não gozo, prefiro o barulho ao retrato de uma menina de vermelho que passa na rua em sacola de renda e ela não leva o  silêncio mas o barulho das solas na calçada Tac Tac , vejo o pobre velho Antunes, debaixo do umbral da varanda , com aqueles olhos caindo sobre nós , interrogando,  olhos com mãos que nos abrem as profundezas , entra dentro de nós sem quase pedir permissão, mas  pedindo… e  não nos é inegável dito previlégio,  vê-lo ali , com pequenos pedaços de pão na mão, as metades de uma vida inteira no polegar e na ponta do indicador , em pedacinhos minúsculos que rolam até alçar a calçada e oiço-o a pensar sem ser eu quem aqui está  «Um dia, quando as pedras deixarem de ser pedras »  E lembro-me do meu velho amigo Jorge de Sena , a mesa , as cadeiras velhas  , como um homem mata saudades numa cadeira e ama  invísivel sempre presente vida, eu lembro-me de me dizeres , sem nunca me entediares, que a escrita podia ser « o reverso glorioso dos erros»  os meus olhos procuravam-te achando-te no escuro ausente de luz , nas tuas unhas ainda rosadas pela juventude, lembro-me do Antunes, se calhar, se calhar ele devia estar aqui em vez de estar com aqueles parvos pássaros, deixa-o,  cai o livro da prateleira e com isto toca-te o pensamento que me acompanhava na minha deambulação  « Um dia, Marcio, iremos amar como uma pedra» Talvez. Não sei, nunca tinha pensado muito nisso, tenho medo as vezes de pensar, as vezes nem penso, apenas sinto percebendo e não comprendo porque percebendo temos que dizer que comprendemos , as pedras não pensam, as ribeiras não falam,  os pássaros não levam a porra de vida nenhuma no bico, os animais nos ignoram,  embargando no silêncio que eu detesto, a água da ribeira , dos cheiros  dos sustos das malditas cobras que aparecem num segundo e noutro fogem, esquece. Deito os papéis para o lado, rasgo a caneta , não rasgo, é apenas a  forma para dizer como me sinto , a caneta, para o lado,  o Sena observa-me na minha santa impaciência e nem um pio me diz. Atesta-me o pássaro que resolve aparecer e poisar ao lado da janela. Mais calmo agora. Que cor dou ao pássaro? Pergunto. Que se dane, que te danes pássaro, ficas rojo , ou rosa, ou vermelho, porque razão vou fazer de ti Preto? Não quero aqui nenhum pássaro preto, quero um amarelo, bonito, com penas compridas e  linhas traçadas de um porta-penas nas suas plumas lindas, quero que ele cante, saltite de galhinho em galhinho , não o quero dentro da gaiola, não o quero ver morto, quero vê-lo a desenhar circunferências no céu, entrar sobre ele e quero vê-lo a ouvir Tracy Chpman, quero uma tartaruga que desenhe um círculo na pequena água côncova da ribeira quero ser pedra e aprender a imitar a água.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Você, caríssima Mia Love, não me poderia nem aquecer nem arrefecer em agua morna com os mais exóticos sais de banho, não, deixe-me que lhe diga que o seu hard-core impressiona pela palmípede vulgarização do mais trivial estereotipo , ninfomaníaca, psicopata fera pertencente ao gregário humano da mente supérflua e que retira o, antes almejado , amor. É isso mesmo, Deixe-me que lhe diga, se não sabe, você é a dessexualização clonada dos tempos e condecorada com medalhas de pódio da plebe irracionalizada por vibradores e páginas virtuais, a explorar o fácil e o simples. Queira saber que não me deslumbra em nada. As suas criaturas são plumas suas que afinal nem lhe dão a provar o prazeroso sabor do apocaliptíco orgasmo, afinal, quando o macho, digno de peito , nobre cavalheiro, nobre guerreiro, penetra com a sua espada o desejado momento do amor e clama o seu hino patriótico defronte da sua amada em êxtase puro de contemplação, isso, é elevação no expoente máximo. Não sou dado a extremos, nem a meios, eu ,sou para tudo. Espanta-me o seu Q.I e não é por admiração. Sei que adora ´ficar como um rebuçado a exercitar as nádegas , as mamas ,as tetas,as chuchas, as mamaduras, os glúteos, nas suas manhãs de aéróbica matinais ou dar corridas pelos parques e ruas da nossa cidade de Grândola( não escusso de lhe repetir que para 12 mil habitantes, não existe nenhum energúmeno e nem terra que tivesse feito renascer este pobre, paupéerimo, apertado país de fato de pinguim, que o adorado Zequinha, despiu para a gloriosa liberdade de pecaminosas , prevaricadoras e infames criaturas,( expressão que você adora usar, fazendo sentir , todo ou quase o macho, num Tacanho, ) como você, Digo-lhe, que pertence á plebe da cerveja e da classe que julga ter alguma mas que a perde quando uiva sílabas inconcebíveis de perceber , não gesticule, não se deprima, não se reprima( faça como a minha mulher faz e faça de conta que nem aqui estou) mais lhe devo dizer que você se aproxima da imbecilidade humana como a vaca do pato e do pato a testerona; essas meias de renda e esses toques a mulher Marlhoro, não escondem a sua origem camponesa e de quem gosta de cacofonia como os bípedes que dançam em tanga de palha e copulam ao lado das galinhas sob alaridos de gansos . Uma questão da Natureza . Diz-me. Natureza das paixões, frívolas e tolas, pois os meus festim, bacanais gloriosos, são bem melhores que os seus. São filosóficos, são sensuais,melódicos, lascivos, eróticos,artísticos, digno de um poeta contemplado por musas , dignos de uma ode , de um tributo a um Deus Grego, eu, eu, e apenas eu. queira saber.




Conserve-se e reduza-se à sua insignificância ( peço-lhe que não me agrida nas trombas, escolha o joelho; estômago, também não. Cólicas terríveis)


Atenciosamente :Lorde Roberto

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Manuscrito encontrado na Igreja de S. Paulo

DESIDERATA – Do Latim Desideratu: Aquilo que se deseja, aspiração.


Siga placidamente por entre o ruído e a prece e lembre-se da paz que pode haver no silêncio.
Mantenha boas relações com todas as pessoas que possível, mas sem abdicar da sua personalidade.

Fale a sua verdade clara e serenamente; e ouça os demais, mesmo os tolos e os ignorantes que, também eles têm a sua história.

EVITE AS PESSOAS AGRESSIVAS E GRITANTES, QUE SÃO UM PESO PARA O ESPÍRITO.

Se você se comparar com os outros, você tornar-se-á presunçoso ou deprimido pois sempre existiram pessoas melhores ou piores do que você.

Vibre com as suas realizações e também com os seus planos.

Tenha interesse na sua profissão não importa quão humilde: ela é um património concreto sensível às mudanças de fortuna que o tempo traz.

Seja cauteloso nos seus negócios, pois o mundo está cheio de malícia.

Seja você mesmo. PRINCIPALMENTE NÃO SEJA FINGIDO EM MATÉRIA DE AFEIÇÃO.

Nem seja cínico em relação ao amor, pois mesmo em face de toda a aridez e todo o desencontro ele é eterno como a vida.

Acumule vontade com o passar dos anos despindo-se com serenidade das coisas da juventude.

Acumule fortaleza de espírito para defender-se das infelicidades súbitas mas não se desgaste com frutos da imaginação.

Muitos temores nascem da solidão e do cansaço.

Além de uma disciplina integral seja gentil com você mesmo.

Você é um filho do Universo, como as árvores ou as estrelas, é um direito seu estar aqui, e pareça-lhe ou não evidente, o Universo, sem nenhuma dúvida, está evoluindo conforme deveria.

Portanto, esteja em paz com Deus, quaisquer que sejam os seus trabalhos e aspirações, mantenha-se em paz com a sua alma, em meio ao tumulto da vida.

Com toda a falsidade, tédio e sonhos despedaçados, ainda assim o mundo é belo.

Seja cuidadoso. Procure ser feliz.

Manuscrito encontrado na velha igreja de São Paulo em Beltimore, datado de 1692.